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Gestão de Entulho de Demolição: Planeje e Economize na Obra

A gestão eficiente do entulho de demolição começa muito antes da primeira marretada. Ela nasce no planejamento, na estimativa precisa dos volumes que serão gerados. Quem nunca subestimou a quantidade de resíduo e acabou pagando mais caro por caçambas extras ou tendo a obra parada por falta de espaço para armazenamento? Pois é, acontece. Mas com um método claro, podemos minimizar – e muito – esses imprevistos.
O gerenciamento inadequado não só gera custos extras com transporte e descarte, mas também pode levar a multas ambientais pesadas, atrasos no cronograma e uma imagem negativa para a construtora ou profissional responsável. Por outro lado, um bom planejamento otimiza o uso de caçambas, facilita a logística de remoção e abre portas para a reciclagem e o reaproveitamento de materiais, gerando economia e agregando valor sustentável ao projeto.
O Que é Entulho de Demolição?
Antes de calcular, precisamos entender exatamente o que estamos medindo. Entulho de Demolição, tecnicamente conhecido como Resíduo da Construção Civil (RCC), é todo material resultante de demolições, reformas, reparos e até mesmo de escavações em obras de construção.
Pense na variedade de coisas que saem de uma demolição:
- Pedaços de concreto (vigas, pilares, lajes)
- Tijolos e blocos cerâmicos ou de concreto
- Argamassa
- Madeira (formas, pontaletes, esquadrias velhas)
- Metais (vergalhões de aço, perfis, tubulações)
- Gesso (placas de drywall, forros)
- Vidros
- Plásticos (tubos, embalagens)
- Solo e rochas (provenientes de escavações)
- Materiais de acabamento (pisos, azulejos, telhas)
É uma mistura heterogênea, certo? E é aqui que entra um ponto fundamental: a classificação desses resíduos. No Brasil, a Resolução CONAMA nº 307/2002 (e suas atualizações) classifica os RCC em quatro classes:
- Classe A: Resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados. É o “filé mignon” do entulho: concreto, tijolos, blocos, argamassa, telhas cerâmicas. Podem ser triturados e virar agregado reciclado para pavimentação, base de estradas, etc.
- Classe B: Resíduos recicláveis para outras destinações. Aqui entram plásticos, papel/papelão, metais, vidros e madeira. A chave é a segregação na fonte!
- Classe C: Resíduos para os quais não foram desenvolvidas tecnologias ou aplicações economicamente viáveis para reciclagem/recuperação. O gesso é um exemplo clássico aqui.
- Classe D: Resíduos perigosos. Tintas, solventes, óleos, amianto (muito cuidado com este!), materiais contaminados. Exigem tratamento e descarte especializados.
Por que essa classificação é importante antes de calcular o volume total? Porque ela impacta diretamente no custo e na forma de descarte. Separar os materiais na própria obra (segregação na fonte) pode reduzir drasticamente os custos de destinação, já que materiais Classe A e B podem ser vendidos ou enviados para recicladoras a um custo menor (ou até gerando receita), enquanto a mistura indiferenciada geralmente vai para aterros específicos de RCC, com um custo por metro cúbico ou tonelada bem mais salgado. Além disso, a legislação exige um Plano de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC) para muitos empreendimentos, detalhando como cada classe será tratada.
Portanto, entender a composição do seu entulho de demolição é o primeiro passo estratégico.
Passo a Passo Essencial para Calcular o Volume de Entulho de Demolição
Agora, vamos ao cálculo propriamente dito. Parece simples – medir e multiplicar – mas o diabo mora nos detalhes, especialmente no tal do “empolamento”.
1. Identificação e Medição Precisa (Volume Sólido)
O ponto de partida é saber o que será demolido e quais as dimensões desses elementos. Você precisa levantar as quantidades de cada parte da construção que irá abaixo:
- Paredes: Meça comprimento, altura e espessura. Lembre-se de descontar vãos de portas e janelas, se forem significativos e se os caixilhos forem removidos separadamente.
- Exemplo: Parede de 20m (comprimento) x 3m (altura) x 0,15m (espessura) = 9 m³ de alvenaria sólida.
- Lajes e Pisos: Meça a área (comprimento x largura) e multiplique pela espessura.
- Exemplo: Laje de 10m x 8m x 0,12m (espessura) = 9,6 m³ de concreto sólido.
- Vigas e Pilares: Meça a seção transversal (largura x altura) e multiplique pelo comprimento.
- Exemplo: Viga de 0,20m x 0,40m x 15m (comprimento) = 1,2 m³ de concreto sólido.
- Revestimentos: Se for remover apenas reboco ou azulejos, meça a área e multiplique pela espessura média do revestimento.
- Exemplo: Reboco de 100m² (área) x 0,02m (espessura média) = 2 m³ de argamassa sólida.
Dica de Ouro: Use plantas e projetos existentes sempre que possível para obter as dimensões. Se não existirem ou estiverem desatualizados, a medição in loco é indispensável. Seja meticuloso! Um erro aqui se propaga por todo o cálculo. Para obras maiores, softwares de modelagem (BIM) podem ajudar a extrair esses volumes com mais precisão a partir do modelo 3D.
Some os volumes sólidos de todos os elementos que serão demolidos. Vamos supor que, no nosso exemplo simplificado, o volume sólido total seja: 9 m³ (parede) + 9,6 m³ (laje) + 1,2 m³ (viga) + 2 m³ (reboco) = 21,8 m³.
2. O Fator Crucial - Empolamento do Entulho de Demolição
Aqui está o “pulo do gato” que muitos esquecem ou aplicam de forma genérica. Quando você demole uma parede de tijolos maciços, ela não vira um monte de tijolos perfeitamente empilhados, certo? Ela vira uma pilha irregular, cheia de espaços vazios entre os pedaços. Esse aumento de volume aparente devido aos vazios é o empolamento.
O volume que você calculou no passo anterior (volume sólido) é o volume do material antes de ser demolido. O volume que a caçamba vai transportar é o volume depois da demolição, ou seja, o volume empolado.
O fator de empolamento NÃO é um valor fixo! Ele varia significativamente dependendo:
- Do tipo de material: Materiais mais fragmentados ou irregulares (como alvenaria) tendem a ter um fator de empolamento maior do que materiais mais densos ou que quebram em pedaços maiores (como concreto).
- Da forma como a demolição é feita: Demolição manual pode gerar pedaços mais uniformes (menor empolamento) do que demolição mecanizada com rompedor, que fragmenta mais.
- Do grau de compactação no transporte: Uma leve compactação na caçamba pode reduzir um pouco o volume.
Valores de Referência Comuns (Atenção: são apenas referências! Use com critério):
- Concreto: 1,5 a 1,8 (ou seja, o volume aumenta de 50% a 80%)
- Alvenaria (tijolos/blocos): 1,6 a 2,0 (aumenta de 60% a 100%)
- Argamassa/Reboco: 1,7 a 2,0
- Solo Comum: 1,2 a 1,4
- Rocha Detonada: 1,6 a 1,8
- Madeira: Varia muito, pode ser baixo se em peças grandes (1,2) ou alto se muito fragmentada (1,8+).
- Gesso/Drywall: Tende a ser volumoso, fator pode chegar a 2,0 ou mais.
Como escolher o fator correto?
- Experiência: Se você já demoliu estruturas semelhantes, use os dados históricos da sua empresa. Anote os volumes sólidos estimados e compare com o número real de caçambas utilizadas.
- Literatura Técnica: Consulte tabelas de composição de custos (como TCPO ou SINAPI) que geralmente trazem fatores de empolamento médios para diferentes serviços.
- Bom Senso e Análise Crítica: Avalie o material predominante e as características da demolição. Na dúvida, é melhor ser um pouco conservador (usar um fator ligeiramente maior) para evitar surpresas. Usar um fator genérico de “2x” para tudo, como mencionado no resumo inicial, pode levar a superestimativas ou subestimativas significativas dependendo do material!
3. Cálculo do Volume Empolado
Agora, sim, aplicamos o fator de empolamento ao volume sólido calculado. O ideal é fazer isso por tipo de material, se possível, para maior precisão.
Fórmula: Volume Empolado = Volume Sólido x Fator de Empolamento (FE)
Continuando nosso exemplo (assumindo fatores médios para simplificar):
- Alvenaria: 9 m³ (sólido) x 1,8 (FE) = 16,2 m³ (empolado)
- Concreto (laje + viga): (9,6 + 1,2) m³ = 10,8 m³ (sólido) x 1,6 (FE) = 17,28 m³ (empolado)
- Argamassa (reboco): 2 m³ (sólido) x 1,9 (FE) = 3,8 m³ (empolado)
Volume Total Empolado Estimado = 16,2 + 17,28 + 3,8 = 37,28 m³
Veja como o volume quase dobrou em relação ao volume sólido inicial de 21,8 m³! Ignorar o empolamento levaria a um erro grosseiro na contratação de caçambas.
4. Estimando o Número de Caçambas
Com o volume total empolado em mãos, o próximo passo é dimensionar o transporte. As caçambas de entulho têm capacidades variadas, sendo as mais comuns no Brasil:
- Pequenas: 3 m³
- Médias: 5 m³ (muito usadas)
- Grandes: 7 m³
Fórmula: Número de Caçambas = Volume Total Empolado / Capacidade da Caçamba
Usando nosso exemplo e uma caçamba padrão de 5 m³:
Número de Caçambas = 37,28 m³ / 5 m³/caçamba = 7,456 caçambas
Importante: Você não contrata “0,456” de uma caçamba. Sempre arredonde para cima! Neste caso, você precisaria contratar 8 caçambas de 5 m³.
Considerações Adicionais:
- Peso: Embora o cálculo inicial seja por volume (que é como as caçambas são geralmente cobradas), lembre-se que há limites de peso por caçamba e por caminhão. Entulho de concreto é muito mais pesado que entulho de drywall. Empresas de caçamba sérias respeitam os limites legais de carga. Misturar materiais muito densos com muito leves pode otimizar o peso, mas dificulta a reciclagem.
- Logística: Quantas caçambas cabem no seu canteiro de uma vez? Qual a frequência de troca que a empresa de caçambas consegue oferecer? Isso impacta no ritmo da demolição.
- Segregação: Se você planeja separar os materiais (Classe A, B, etc.), precisará de caçambas distintas para cada tipo ou de um sistema eficiente de baias de armazenamento temporário antes de encher a caçamba correta. O cálculo de volume deve ser feito para cada classe separadamente.
Como Calcular o Entulho de Demolição para Diferentes Tipos de Material?
Como vimos, o fator de empolamento é a chave da diferença. Vamos detalhar um pouco mais para os materiais mais comuns:
- Concreto (Simples e Armado): Material denso. O aço no concreto armado aumenta o peso, mas não impacta tanto o volume empolado quanto a fragmentação do concreto em si. Fatores entre 1,5 e 1,8 são usuais. Se a demolição gerar peças muito grandes (difícil de acontecer sem britagem secundária), o fator pode ser menor. Se for muito fragmentado por rompedor, pode se aproximar de 1,8.
- Alvenaria (Tijolos Cerâmicos, Blocos de Concreto): Pela natureza modular e pela presença de juntas de argamassa, a fragmentação gera muitos vazios. É comum usar fatores mais altos, de 1,6 até 2,0, especialmente se os blocos forem vazados.
- Madeira: Depende muito da forma. Vigas e tábuas grandes terão baixo empolamento (1,2-1,4). Ripas, compensados quebrados e madeira muito deteriorada podem gerar mais volume aparente (1,6-1,8). A vantagem é que madeira limpa (Classe B) tem bom potencial de reciclagem ou reuso (lenha, biomassa).
- Gesso e Drywall: Leves, porém volumosos quando quebrados. O gesso (Classe C, geralmente) exige descarte específico e não deve ser misturado com Classe A. O empolamento pode facilmente passar de 2,0. O cálculo aqui é mais crítico pelo volume do que pelo peso.
- Metais (Aço, Alumínio, Cobre): Alta densidade, baixo empolamento (1,1-1,3). O foco aqui é a segregação (Classe B) devido ao alto valor de reciclagem. O volume costuma ser pequeno comparado ao concreto e alvenaria, mas o valor agregado é alto.
- Solo e Terra (Escavação): Embora não seja “demolição” no sentido estrito, a remoção de solo gera resíduo. O empolamento do solo varia com o tipo (argiloso, arenoso) e umidade, geralmente entre 1,2 e 1,4.
A Melhor Abordagem: Sempre que possível, calcule o volume sólido de cada material principal separadamente e aplique um fator de empolamento específico para cada um antes de somar os volumes empolados totais. Isso dará uma estimativa muito mais precisa do que aplicar um fator médio único para toda a massa de entulho de demolição.
Destinação Correta: O Que Fazer com o Entulho de Demolição Gerado?
Calcular certo é metade da batalha. A outra metade é garantir que esse entulho de demolição tenha um destino final adequado, legal e, se possível, sustentável. Jogar entulho em terreno baldio, margem de rio ou qualquer local inadequado é crime ambiental, sujeito a multas pesadas para o gerador (você, sua empresa) e para o transportador.
As opções corretas são:
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Contratação de Empresa de Caçambas Licenciada: É a solução mais comum para a maioria das obras.
- Verifique a Licença: Exija da empresa o alvará de funcionamento e a licença ambiental para transporte de RCC.
- Exija o CTR (Controle de Transporte de Resíduos): Este documento é FUNDAMENTAL. É a garantia de que seu entulho foi descarregado em um local licenciado (Aterro de RCC, ATT - Área de Transbordo e Triagem, ou Recicladora). Uma via do CTR preenchida e assinada pelo destino final deve retornar para você. Guarde esse documento! Ele é sua comprovação de destinação correta em caso de fiscalização. Sem CTR, você não tem como provar que não houve descarte ilegal.
- Combine a Logística: Defina os tamanhos de caçamba, locais de posicionamento, frequência de troca e, claro, os custos.
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Aterros de Resíduos da Construção Civil (RCC): São locais licenciados especificamente para receber entulho, principalmente Classe A. Empresas de caçamba geralmente levam o material para lá.
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Áreas de Transbordo e Triagem (ATT): Locais intermediários onde o entulho misturado pode ser descarregado, separado (triagem) por classe e, então, encaminhado para o destino final apropriado (aterro, reciclagem).
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Usinas de Reciclagem de RCC: A melhor opção do ponto de vista ambiental e, muitas vezes, econômico. Recebem principalmente material Classe A (concreto, alvenaria) e o transformam em agregado reciclado (brita reciclada, areia reciclada) que pode voltar para a construção civil em aplicações não estruturais (bases de pavimento, aterros, etc.). Algumas usinas também processam madeira e outros recicláveis (Classe B). Se sua obra gera muito material Classe A limpo, vale a pena cotar o envio direto para uma usina.
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Reutilização na Própria Obra: Se houver espaço e equipamento (como um mini britador), parte do entulho Classe A pode ser processada e reutilizada no próprio canteiro como material para sub-base, enchimento de valas, etc., reduzindo custos de compra de material novo e de transporte/descarte. Verifique as normas técnicas e a legislação local sobre as possibilidades de reuso.
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Descarte Especializado para Classe D: Materiais perigosos (amianto, tintas, solventes) NUNCA devem ser misturados ao entulho comum. Devem ser segregados, acondicionados corretamente e enviados para empresas especializadas em tratamento e destinação de resíduos perigosos, com documentação específica (MTR - Manifesto de Transporte de Resíduos).
A segregação na fonte é a chave para otimizar a destinação. Ter diferentes baias ou caçambas para Classe A, Classe B (separando madeira, metal, plástico), Classe C (gesso) e Classe D facilita muito o processo e pode gerar economia significativa. Educar a equipe de demolição sobre a importância da separação é um investimento que se paga.
Calculando o Entulho de Demolição em Obras de Maior Porte
Tudo o que falamos até agora se aplica a obras maiores, mas a escala e a complexidade aumentam. Demolir um edifício inteiro, um galpão industrial ou um conjunto de casas exige um planejamento ainda mais rigoroso.
- PGRCC Obrigatório: Para obras de maior porte, a elaboração e aprovação de um Plano de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC) junto aos órgãos competentes é geralmente uma exigência legal. Este plano detalha as estimativas de geração por tipo de resíduo, as formas de acondicionamento, transporte, destinação e as metas de redução, reutilização e reciclagem. O cálculo preciso do volume de entulho de demolição é a base do PGRCC.
- Estimativa por Fases e Elementos: A demolição de um prédio não acontece toda de uma vez. Ela é faseada (andar por andar, bloco por bloco). O cálculo do entulho deve acompanhar esse faseamento para planejar a logística de remoção. É preciso estimar o volume de vigas, pilares, lajes, alvenarias, revestimentos, instalações, etc., de forma muito mais detalhada.
- Uso de Tecnologia: Softwares BIM (Building Information Modeling) são ferramentas poderosas para obras grandes. Se o edifício a ser demolido tiver um modelo BIM, a extração dos volumes de cada material pode ser feita com alta precisão. Mesmo sem BIM, planilhas eletrônicas bem estruturadas são essenciais para organizar os cálculos de centenas ou milhares de elementos.
- Logística Complexa: Remover grandes volumes de entulho de áreas urbanas densas exige planejamento de rotas de caminhão, horários permitidos para transporte, dimensionamento de frota (muitas vezes, caminhões basculantes maiores são usados em vez de caçambas estacionárias), e áreas de estocagem temporária no canteiro (baias bem definidas).
- Equipamentos de Demolição: O tipo de equipamento usado (grandes escavadeiras com rompedores, tesouras hidráulicas, guindastes) influencia na granulometria do entulho e, consequentemente, no fator de empolamento e na facilidade de segregação e processamento.
- Potencial de Reciclagem: Obras maiores geram volumes que tornam a reciclagem economicamente mais atraente. A instalação de britadores móveis no canteiro para processar o entulho Classe A pode ser viável, transformando um custo de descarte em um ativo (agregado reciclado). A venda de grandes quantidades de sucata metálica (Classe B) também pode gerar receita relevante.
Em resumo, para obras de grande porte, o cálculo do entulho de demolição deixa de ser apenas uma estimativa operacional e se torna um componente estratégico do planejamento financeiro, logístico e ambiental do projeto. A precisão e o detalhamento são ainda mais cruciais.